quarta-feira, 10 de novembro de 2010

POESIA IS DEAD

Para uma desaceleração da consciência:

A linguagem nos deixa íntimo de satanás, pensam os bichos sobre nós.

Para uma moral dionisíaca:

Quem se importa com esse cálice de vinho? Olho-o. é lindo. Roxo como a violeta e o hematoma. Por que não sorver de sua sabedoria? Quem se importa sobre o dia de hoje? Ou sobre as horas? Quem se importa em ser alguém? Se nem Pessoa o foi? Beberei. Até o final. Beberei pois é a primeira vez que bebo. E assim sempre.

Para uma compreensão do amor:

O que é o amor? O amor é o que sinto agora? Ou ele é essa lembrança remota do que amei algum dia? O amor pode ser conjugado no passado? Creio que não. Amor é presente. Amor é respiração. Amor não é palavra. Deve ser cheiro ou gosto. Amor é música? Amor é cheiro. Só cheirando pra viver. Lembrar de cheiros não é cheirar.

O corpo e suas razões:

Porção de carne cheirosa. Se alguém disse que o corpo fede, estava enganado. e só pelo caminho do corpo que se chega à alma. O corpo é a porta e também a própria alma. Está tudo pelos ares. O suor que vejo na mulher que ao meu lado passa. Esse suor escorre por sua testa, por sua coxa. Esse suor é meu. Eu o quero. Eu o amo. Sua história ali está presente e eu entendo tudo sem saber explicar. Na testa de Alessandra eu via escorrer seus delírios salgados.

Em busca de deus:

É o momento que importa. Não, a vida não se passa em anos. O tempo, como já foi provado, foi invenção de satã. O momento diz tudo. Mas o que ele diz não se pode ouvir. Podem se passar anos, não me importo, eu espero, mas eu sei, sempre saberei quando ele chegar. Quando ele finalmente voltar. Eu já vi o momento. E ele diz tudo. Casamento, carreira, ser escritor, nada disso tem relevância. O que se quer é o momento. É quando deus desce de sua esquizofrenia e lambe nosso pescoço. Uma fumaça que desliza pelo ar. Uma música toca ao fundo, tem anos que não se ouve essa música. É uma melodia doce e acolhedora. Ela fala baixo, mas nos convence do melhor. Não, não se morre. Se morrer, que morra.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

outro trecho do capítulo 21

"... É preciso gritar. Negar. Mandar ao cú todos esses padrões que nos são empurrados goela abaixo. Senão, fica-se louco. Estou quase nisso. Estamos todos na corda bamba. Me parece que por muito pouco posso surtar de uma hora para outra. Basta um motivo e esse motivo pode ser nada. Um gesto errado. Uma palavra dita ou um ato falho. A loucura me causa medo, não por suas conseqüências, mas por sua proximidade..."

trecho do capítulo 21 do livro inédito, inacabado..

"...foi a mais espetacular, mais inteira, mais saborosa que algum dia já provei. Ela era pura rebeldia, ela não sabia para aonde ir. Ela era louca. De uma forma saudável, porém louca. Talvez o errado foi eu em não entender seu espírito livre e descompromissado. Eu fiz tudo errado, em resumo. Fiquei tão chocado com sua beleza que tive pressa e isso, é bom que se deixe claro, era uma coisa estrangeira à ela. Tudo nela era espontaneidade. Eu é que fui pragmático em demasia. Queria controle, queria respostas, enquanto ela, com sorrisos de escárnio, só queria gozar de palavras não ditas. Nunca me disse alguma coisa sobre o amor. E nisso ela acertou. Seu pensamento era como música..."

capítulo 34 do livro inédito, inacabado, impublicável "apontamentos sobre o delírio"

- Nosso encontro derradeiro, explosivo, enigmático, eterno, só aconteceria um tempo depois desse beijo. Eu ainda me achava com poder de decisão. Cheguei procurar em outros corpos o amor que só ela sabia me dar. Tentei fugir e esquecê-la, até que um dia ela me manda um pequeno recado totalmente fora de contexto: “quero uma noite no mato com vinho e maconha. O tédio que precederia agente afoga na cama”.

domingo, 17 de outubro de 2010

st nicolau, lágrimas de despedida

estou triste como uma garrafa vazia
se algum dia o amor transbordou
(de minha taça)
hoje ele é tímido e vacilante
por ter manchado de roxo
um suéter branco.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

filosofia de gaveta 2 *

O homem manso: um relato.

Desenvolvimento: Diante de estudos e também especulações de teóricos importantes a respeito do assunto, é possível afirmar que durante grande parte da história humana a natureza teve um papel relevante em sua cultura. Nesse período, pode-se notar, os eventos naturais causavam um misto de admiração, respeito e principalmente medo. Templos e outros registros podem ser encontrados em adoração ao sol e à lua, e as tempestades e as cheias. Mas, de acordo com o analisado, não obstante nossa falta de material, algo aconteceu e mudou radicalmente a compressão humana sobre o que nós decidimos chamar de natureza. O respeito e a reverência mudaram de tom. O homem, quando resolveu dessecar a natureza e estudá-la minuciosamente, perdeu suas referências mais íntimas; num movimento rebelde quis se tornar dono daquilo de onde provinha. Os paradoxos não pararam por ai. Para nosso estudo fazer um completo sentido, deveríamos esclarecer os pormenores dessa mudança. Algumas perguntas ainda ficam no ar e serão respondidas ao longo dessa dissertação, se possível.

Todas as evidências nos levam a crer que a espécie humana obteve êxito devido a sua coragem. Alguns argumentam que a inteligência seria parte de processo importante nessa ascensão, inclusive estudos muito sérios de anatomia comparativa indicam que a raça humana tinha uma massa encefálica sensivelmente maior capaz de auxiliá-los em empreendimentos intelectuais. Nós não descartamos essa hipótese, apesar de ainda acharmos que a coragem não pode ser deixada de lado, visto que a musculatura humana estudada não é robusta. A maioria dos exemplares é mal desenvolvida ou com excesso de tecido adiposo.

No decorrer dos séculos, talvez entre os séculos da LUZ E DA GLÓRIA e, possivelmente, TRIUNFAL XVI, ocorreu um contrato tácito ou explícito(não se sabe ao certo) para uma maciça domesticação de todos os exemplares. Em vez da caça e da violência, outros valores passaram a serem mais bem vistos, como por exemplo, a benevolência entre os membros e o conforto geral de seus exemplares. Houve uma produção grande de alimentos cuja abrangência era significativa. A vida livre, dançante e violenta foi substituída por aglomerados parecidos com caixotes que eram comandados de acordo com uma conduta de norma específica. O homem conquistava sua emancipação. Não havia problemas com a escassez de alimento e sempre se encontrava protegido de eventuais forças da natureza ou mesmo de animais. Só que essa domesticação não fez bem ao homem. A falta do perigo tornou a vida cinza. A depressão foi diagnosticada como um irrefutável desânimo. Quase ninguém saia mais de casa. O governo ordenou que grades super resistentes fossem instaladas em todos os prédios para tentar conter a onda de suicídio corrente.

Esse foi um breve resumo parte integrante de uma monografia da universidade de plutão xvii para elucidar o problema do fim da raça humana.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

filosofia de gaveta*

De acordo com a proposta do espaço, incitaremos uma discussão a partir de uma idéia de interesse de algum filósofo, mas sem o rigor da academia. Por isso, filosofia de gaveta, filosofia esquecida, filosofia alcoólica. Aqui não é o espaço para grandes estudos nem tampouco comparações e análises sistemáticas sobre a verdade e a salvação humana. Já de antemão nos privamos dessa responsabilidade mesmo porque pensamos que o melhor lugar para a instrução é o banheiro, e só tem tempo de ficar inteligente quem sofre do intestino. Muito melhor que escrever ou ler é se distrair ou beber, entre outras coisas. A leitura, confesso, acontece por uma necessidade quase fisiológica de se criar mundos, assim como no processo da escrita. Nós precisamos da narrativa para que não fiquemos todos loucos e suicidas. A literatura, de Dostoiévski aos evangelhos, nos convence de que o mundo tem um sentido determinado. Que a relação causa-efeito não é uma mera abstração de uma mente doentia. Desse modo, o mundo se torna tão crível quanto um romance escrito há quinhentos anos. É assustador como um livro escrito por alguém tão distante tenha mais sentido do que nossa própria vida no instante atual. Quando se trata da vida, ela crua como tem que ser, não cabe num romance, nem palavras podem defini-la. Acordo deprimido com gosto de guarda chuva na boca. Com cabelo amassado me dirijo à geladeira. Pego um resto de coca cola sem gás e bebo com vontade; nesse meio tempo um passarinho meio esverdeado aparece em meu apartamento e come algumas migalhas no chão e vai embora. Se fosse num filme, esse pássaro com certeza retornaria e justificaria sua aparição por algum motivo, mas na vida não. Ele simplesmente aparece come e vai embora.

Essa idéia, como se pode ver, não chega a ser completamente minha. Na verdade, não é de outra pessoa específica. Se existe referências nesse espaço é em relação à vida, a vida é o importante e não a teoria. Kant teve imensa importância para o desenvolvimento da filosofia moderna. Entretanto, seu ponto mais interessante é que ele era metódico, quase nunca saiu de sua cidade e ainda há rumores de que morreu virgem. Será que se fosse desencabaçado escreveria uma quarta crítica?

Schopenhauer é acusado de pessimista. Esse rótulo pode lhe cair bem, mas se alguém adentrar em seus devaneios verá que seu pessimismo nada mais é do que um aguçado senso de humor(negro). E que é quase impossível não concordar com sua teoria sobre a insatisfação e a dor humana. O pêndulo ao qual estamos todos fadados. O pêndulo diz: insatisfação e tédio. Insatisfação e tédio. Não estaria Schopenhauer nos dando carta branca para viver justamente ao afirmar que o mundo é um palco no qual se encena tragédias?